Compartilho neste post um texto publicado na Revista Bons Fluídos, Editora Abril, de autoria de Carlos Solano, que é Arquiteto, escritor, coordenador da campanha "Vamos Plantar Um Milhão de Árvores", e também pesquisador devotado da cultura popular e seus segredos de proteção da "casa", além de transitar pela ecologia, filosofia, poesia, Feng Shui com o intuito de fornecer indicações práticas que possam melhorar a qualidade de vida em geral. Com todas estas qualidades Carlos ainda tem um sorriso franco e escreve com o coração. E como tudo o que é bom é compartilhado no "nosso Jardim"... Trago aqui para vocês, Carlos Solano com seu texto:
Pois me contava seu Antonio, no meio daquele quintalzão, no meio de latas e latinhas plantadas, cheias de cheiros e segredos, no meio de um bom caneco de café passadinho na hora: _ "De tudo, o que vale mais é se arvorecer". Pausa. Arvorecer? O que será isso, meu Deus? Encabulado, e sem querer ofender, me propus discretamente a investigar. E levei a conversa para o lado mais evidente: o das árvores e das madeiras. _ "A madeira é viva", me respondeu. _"Só por isto, já merece um afeto". Uma misturinha de cera de abelha, carnaúba e parafina, evita o ressecamento, que favorece as pragas. A cera de abelha, que ainda perfuma, imuniza por causa da própolis e, é boa para os móveis. O barro da terra de formigueiro e a fumaça do fogo à lenha também a protegem. Por causa do fogo, Seu Antonio jura que "em casa de mulher não entra cupim". Contra umidade, ele usa sebo animal ou qualquer azeite - de mamona, de dendê. Para a madeira que toma sol e chuva, o óleo de linhaça é um verniz natural, e ainda estimula a cor. Para clarear o assoalho, esfrega-se a folha da piteira, batida e rasgada, junto com a areia do rio. _"Mas, o mais importante é colher a madeira madurinha (para não ser ofendida pelas pragas), na lua minguante (para recolher o fortificante) e nos meses sem R, de maio a agosto (seca, para não empenar)". _Mas podemos usar madeira em casa sem culpa? Cortar árvore não ofende as matas? Levei a conversa adiante, tateando pelos caminhos do "arvorecer". _"Depende", disse ele. "Árvore se planta, árvore cresce". Claro, a madeira é o único material renovável... Uma montanha de areia, uma mina de calcáreo ou de minério de ferro - elementos tecidos pela Natureza ao longo de milênios - não se recuperam jamais. Mas a madeira deve ser certificada com um selo ambiental, que garante o manejo ecológico e a salvação das matas. Confirmam as barbas brancas do Seu Antonio que, se replantarmos, "quando o neto estiver morando na casa que foi da avó, o mato já está refeito".
Uma luz! Quem sabe "arvorecer" não tem haver com "deixar florescer", "defender", ou "manter" as matas? Afinal, faz sentido. A árvore é um dos três componentes fundamentais do entorno humano. Os outros são a pessoa e a casa. Diz o maravilhoso Livro das Árvores (OGPTB), que "a floresta é a maior riqueza que podemos deixar para nossos filhos". Sim, deve ser isso! Mesmo porque, hoje, as árvores são os protetores da Terra: impedem a erosão (a destruição do solo e mananciais), perfumam e purificam o ar (retendo as partículas poluentes), doam frutos, servem de habitat para animais e pássaros, equilibram o processo de aquecimento global (absorvem dióxido de carbono e devolvem à atmosfera vapor d'água e oxigênio). As árvores ainda nos favorecem criando lugares de estar (sob uma copa frondosa), de passear (numa alameda), de passar (num portal), de proteção (uma cerca), de beleza (o que é fundamental, pois o feio destrói a sensibilidade). Criando lugares de viver, as árvores também cativam os homens que, por sua vez, voltam a amá-las. Então num fôlego de coragem, concluí em alto e bom tom: Acho muito importante arvorecer as árvores! _"Como assim"?, foi a resposta. _"Arvorecer é arvorejar". Diante da minha perplexidade, ele se compadeceu: "Al-vo-re-cer ou al-vo-re-jar. Alvejar, tornar alvo, amaciar, abrandar, embrandecer o coração empedernido. Isso vale mais do que tudo". Vale mesmo. Mas cá para mim, arvorecer ainda tem - e sempre terá - tudo haver com árvore. Arvorecer é "árvore-ser". Pois não precisamos "arvore-ser"o coração e parar com esta mania de dominar a Natureza? Não precisamos plantar mais árvores - seja em vasos, no jardim, na calçada ou no sítio - como um ato a favor da vida? "Árvore-ser" é saber que vivemos em uma árvore, ou no único país do mundo que tem um nome de árvore" "Pau Brasil". "Árvore-ser" é vestir o verde da nossa e de todas as bandeiras. Pois não é que arvorecer é mesmo tudo o que precisamos? Estão aí os cabelos e as barbas brancas do Seu Antônio para comprovar.
Neste texto, Carlos Solano nos mostra através da simplicidade do "Seu Antonio" a riqueza contida na sabedoria popular que faz parte da nossa cultura existente em códigos e valores locais. Composta por lembranças e símbolos que se entrelaçam na relação afetiva com o lugar onde vivem, pessoas como o "Seu Antonio", criam no seus cotidianos, condições para que saberes ricos em significações sejam tecidos através das lutas e sonhos individuais de cada um. Assim, "Árvore-ser", é como um sonho que primeiro deve surgir no coração para depois acontecer...
E aí, que tal Árvore-Ser?
Beijo no Coração!
Imagens: web/google
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